A Liga dos Blogues Cinematográficos fez o que mais sabe fazer e foi às urnas. Desta vez para apontar os melhores filmes realizados durante a década perdida, tão amada e odiada pelo mundo afora. Cinqüenta e três integrantes da liga participaram da eleição dos melhores filmes dos anos 80.

(Raging Bull, 80)
direção: Martin Scorsese
780 pontos, 32 votos
4 poles, 12 pódiuns
"Uma atuação lendária. Uma fotografia primorosa. Uma edição brilhante. E é engraçado como eu sempre me lembro de Touro Indomável por seus breves créditos iniciais, em que Jake LaMota baila no ringue ao som da Cavalleria Rusticana, de Pietro Mascagni. Esse é Martin Scorsese, um diretor que mesmo em seus momentos mais brutos, consegue fazer poesia" (Fabricio K).

(The Shining, 80)
direção: Stanley Kubrick
708 pontos, 32 votos
1 poles, 10 pódiuns
"Some places are like people: some shine and some don't. Kubrick brilha ao mostrar as relações entre isolamento, bloqueio e criação. Sua câmera nos convida para uma inocente viagem de triciclo. A partir daí, somos hospedados em labirintos alucinantes, corredores sangrentos e assustadores papéis em branco. A imaginação revela-se uma solitária festa perdida no tempo e no espaço. Redrum!" (Ana Paul).

(Once Upon a Time in America, 84)
direção: Sergio Leone
607 pontos, 26 votos
7 poles, 12 pódiuns
"Leone explora como pode a grande produção, até extrair dela uma expressão nova, barroca, que amplia a realidade para se aproximar do sonho e vice-versa. Era Uma Vez na América é um filme sobre a fundação de uma nação à base da contravenção e da força, mas também é a história de um homem, suas escolhas e seus fantasmas. Noodles, cercado pelo ópio e pelo teatro de sombras na casa chinesa, é um pouco de todos nós na sala de cinema, fugindo de nossos fantasmas e ao mesmo tempo os encontrando mais fortes ainda" (Milton do Prado).

(Amadeus, 84)
direção: Milos Forman
442 pontos, 18 votos
4 poles, 8 pódiuns
"São inúmeros os elementos que podem ser destacados em uma obra com a grandeza e a complexidade de Amadeus, no entanto o mais curioso é que numa cinebiogafia do gênio da música Mozart, temos como premissa e foco central a inveja, algo que o divertido, transgressor e irreverente músico não carregava em seu coração, mas foi o que fez sua vida ter o ponto final, devido a seu dom natural que muitos anos de estudos não conseguiriam igualar jamais. Que o diga o infeliz Salieri" (Henrique Miura).

(Nuovo Cinema Paradiso, 88)
direção: Giuseppe Tornatore
419 pontos, 18 votos
1 poles, 3 pódiuns
"O cinema que chora o amor do Cinema e pelo Cinema. A magia da sétima arte desvendada pelos olhos de uma criança, a mesma que faz com que sejamos tão apaixonados e cativos dos sonhos e dos sentimentos criados pelos filmes" (Felipe Leal).

(Do the Right Thing, 89)
direção: Spike Lee
411 pontos, 21 votos
1 poles, 3 pódiuns
"Panfletário e político são dois adjetivos bastante associados a Spike Lee, não raro com carga negativa. Classificar uma obra com essas palavras pode ser uma maneira de irrelevar seus problemas enquanto cinema - como se filmes se resolvessem nas boas intenções e a política falasse por si, independentemente da realização. Panfletário ou político, Spike Lee sempre foi, mas seus filmes estão longe de se apoiarem preguiçosamente nessas classificações. Faça a Coisa Certa, obra-prima de uma carreira brilhante, é tudo isso, mas também é grande cinema, painel de um dia extraordinário em que o calor, as cores e o cheiro de um choque inevitável ultrapassam os limites da tela e atingem o espectador. A lata de lixo despedaça a vitrine e é inevitável encontrar-se pisando descalço em cacos de vidro quando o Faça a Coisa Certa termina" (Diego Maia).

(Paris, Texas, 84)
direção: Wim Wenders
406 pontos, 18 votos
2 poles, 3 pódiuns
"Através de um espelho, Travis e Jane reencontram-se em um espaço de ressonâncias dramáticas, históricas e simbólicas. Primeiramente, enquanto personagens separados há quatro anos da memória que fundou seus sentimentos; depois, como indivíduos que revivem as cicatrizes de suas histórias naquela cabine marcada entre a luz e a sombra; para, enfim, reencontrarem-se nos cacos de uma família, afetivamente, destruída. Estamos na cena do peepshow onde o espelho da cabine impede, fisicamente, a união dos personagens, marcados pela recusa da imagem ainda que exista a possibilidade de ver e pela renúncia da palavra já que é possível olhar" (Marcos A. Felipe).

(Blade Runner, 82)
direção: Ridley Scott
389 pontos, 17 votos
3 poles, 8 pódiuns
"A cidade de Los Angeles em 2019 é uma "Babel indigente", com chuva ácida no lugar do sol e replicantes produzidos à imagem e semelhança dos homens. Pelo menos é assim que ela aparece em Blade Runner, de Ridley Scott, pífio de bilheteria, que virou cult e se mostra atual quase 25 anos depois de seu lançamento. Baseado na obra de Philip K. Dick, o filme é considerado exemplar da estética cyberpunk. Prefiro vê-lo como herdeiro do noir, com sua atmosfera íntima e vocação nostálgica" (Guilherme Lamenha).

(Blow Out, 81)
direção: Brian De Palma
385 pontos, 17 votos
2 poles, 2 pódiuns
"Quando o cinema se declara ao cinema, nem sempre o porta-voz consegue o tom certo. A genialidade deste filme está por toda parte. Da trilha à montagem. Do tom quase cartunesco de Nancy Allen à deslumbrante concepção visual. Brian De Palma, mais do que herdeiro de Hitchcock como insistem em enclausurá-lo, é um diretor que ama cinema, que ama suas possibilidades, que ama contar uma história com todos os truques que lhe são permitidos" (Chico Fireman).

(Full Metal Jacket, 87)
direção: Stanley Kubrick
377 pontos, 18 votos
0 poles, 2 pódiuns
"Alguns filmes são especiais por diversos motivos. Alguns nos conquistam pela beleza, outros pela inteligência, ou pelo humor, ou pela originalidade ou pela audácia. Alguns por tudo isso junto. Um filme assim visto no momento certo de nossas vidas se torna inesquecível. Nascido Para Matar, de Stanley Kubrick, é um desses filmes para mim. Eu o vi alguns dias depois de ter escapado do serviço militar. Na época estava aliviado, mas também me sentindo culpado. 'Que espécie de patriota eu sou?'. Nascido Para Matar destruiu qualquer resquício de culpa enquanto os créditos finais surgiam ao som de Paint It Black. É quase impossível um filme mudar a cabeça de alguém. Mas aconteceu comigo. Mestre Kubrick, obrigado" (Bruno Amato Reame).

(The Purple Rose of Cairo, 85)
direção: Woody Allen
375 pontos, 17 votos
0 poles, 1 pódiuns
"Um Woody Allen sensível, assumidamente folhetinesco e que nos faz amar Mia Farrow. Convenhamos, isso é trabalho de titã. Um filme da minha infância, que fala do amor ao cinema que existe em todos nós" (LeoN).

(Blue Velvet, 86)
direção: David Lynch
369 pontos, 16 votos
0 poles, 3 pódiuns
"Veludo Azul é a ópera seca de David Lynch, exemplo feliz de uma magnificamente tristíssima redundância: um 'noir" negríssimo. Os fãs de Twin Peaks, Coração Selvagem e Cidade dos Sonhos que me desculpem, mas depois de ir tão fundo nas trevas do ser humano, tudo o que viesse a fazer depois só poderia ir mesmo da traquinagem ao redutor. Veludo Azul é a quintessência do humano. Logo, não poderia ser menos negro, seco e estonteantemente sardônico" (André de Leones).

(Videodrome, 82)
direção: David Cronenberg
351 pontos, 16 votos
0 poles, 2 pódiuns
"Enquanto o programador de TV picareta James Woods se perde na sua obsessiva procura pela fonte das violentas imagens que o fascinam, Videodrome vai aos poucos abandonando o terreno da narrativa e se entregando a erupção de imagens particulares pelas quais seu cineasta é tão fascinado quanto seu personagem central. Um filme muito a frente do seu tempo, toda vez que alguém reclamar do horror das imagens contemporâneas, lembre-se que Videodrome fez isto antes e com mais estilo (e sem deixar de reconhecer o fascínio que elas geram)" (Filipe Furtado).

(The Untouchables, 87)
direção: Brian De Palma
333 pontos, 17 votos
0 poles, 0 pódiuns
"14 anos, dinheiro da minha mãe no bolso, e a recomendação: "leva teu avô no cinema. Vai ver aquele filme sobre a série que ele assistia". Eu entro no falecido Cine Vitória, e, pela primeira vez na vida, percebo como aquela tela era grande. Como aquele som era alto. O filme começa com uma música que logo depois eu ia descobrir ter sido feita por um cara chamado Ennio Morricone, e imediatamente uma sensação estranha, mas muito boa, percorre minha espinha, e por cerca de duas horas eu não sou mais eu, eu não tenho avô, eu não estou no Vitória, mas sim na Chicago da Lei Seca. Eu chego ao Vitória uma garota comum, eu saio de lá cinéfila. O primeiro orgasmo cinematográfico a gente nunca esquece" (Fer Funchal).

(The Elephant Man, 80)
direção: David Lynch
323 pontos, 15 votos
0 poles, 1 pódium
"Um filme sobre uma alma linda presa num corpo horrendo, conforme o próprio diretor havia dito. David Lynch mostra a jornada de um homem que só alcança a redenção com a morte. Como a Laura Palmer de Twin Peaks. John Merrick foi tratado durante muito tempo como uma aberração de circo, mas teve a sorte de encontrar alguém que o tratou como um ser humano e descobriu que por trás daquelas feições deformadas existia um ser inteligente e sensível. O Homem Elefante, além de ser capaz de derreter os mais duros corações, é a primeira obra-prima de um dos maiores nomes do cinema na atualidade" (Ailton Monteiro).

(The Last Temptation of Christ, 88)
direção: Martin Scorsese
319 pontos, 12 votos
0 poles, 5 pódiuns
"Jesus de Nazaré, um carpinteiro a construir cruzes usadas pelos romanos para crucificar judeus, antagônico e trágico, não? É um filme desenvolvido em conflitos, a crença religiosa como forma de combustível para libertação, mas não espiritual, uma libertação política, o povo espera alguém lhes livrar do império romano e da pobreza iminente, almejam a paz física, não espiritual. Na cruz, um devaneio, a tentação que o atormentou pela vida finalmente realiza-se. Jesus resolveu seus conflitos religiosos, a tentação física jamais. Scorsese posiciona-se com leve distância, deixando caminho livre para o poder insolente da história. Polêmica? Quase nada!" (Michel Simões).

(Zelig, 83)
direção: Woody Allen
297 pontos, 13 votos
0 poles, 1 pódium
"Falso-documentário em preto-e-branco. Leonard Zelig, o camaleão sem cores, o travesti sem plumas, presente na história onze anos antes que qualquer Forrest Gump. A neurose de Woody Allen e o mundo quase monocromático de Gordon Willis. Muito mais que uma simples brincadeira amparada em truques de fotografia. É investigação da não-existência do ser-humano, da necessidade do todo em favor do ninguém. Discreto, cultuado e talvez não muito querido, espelhando seu próprio criador, Zelig é uma obra (prima?) de erros e acertos. Ora cínico, ora inocente, mas sempre genial" (Antonio Saints).

(Ran, 85)
direção: Akira Kurosawa
275 pontos, 14 votos
0 poles, 2 pódiuns
"Decepção, angústia, assombro. Sentimentos que são desenhados a cada momento de forma mais intensa no rosto do patriarca Hidetora Ichimonji, que, na época do Japão feudal, divide suas terras com os filhos e recebe em troca intriga e cobiça. Seu caminho ao longo do filme é um crescente de desespero, explicitado na interpretação magnífica de Tatsuya Nakadai, numa das maiores atuações de toda a história do cinema. O diretor Akira Kurosawa faz uma releitura da tragédia do Rei Lear e tragédia é a palavra mais adequada para a imagem que fecha o filme, momento melancólico e pessimista que completa toda aquela epopéia de som e imagem - resumida na brilhante seqüência de ataque dos cavaleiros no meio do filme, um momento regido apenas pela trilha sonora e pela mise-en-scène de Kurosawa" (Marcelo Miranda).

(Fanny och Aleksandr, 82)
direção: Ingmar Bergman
270 pontos, 13 votos
0 poles, 1 pódium
"Fanny e Alexander pode até não ser o melhor filme de Ingmar Bergman, mas aqui ele faz sua enciclopédia, utilizando vários temas já explorados em suas obras mais antigas, para o que foi, por muito tempo, seu canto do cisne no cinema. A história se passa na Suécia do início do século XX e é vista pelos olhos de um menino fantasioso lançado ao meio de um conflito de gerações e épocas, no qual eras se confundem e emoções são reprimidas. Tudo é possível e provável, pois tempo e espaço não existem de forma ordenada, criando crises de identidade e personalidade que culminam na obrigatória referência a Deus, em uma das personagens mais fortes e interessantes da carreira do diretor" (Mateus Nagime).

(After Hours, 85)
direção: Martin Scorsese
260 pontos, 13 votos
0 poles, 0 pódiuns
"Talvez o mais perfeito emblema do que foi a fase por qual passou Martin Scorsese nos anos 80, Depois de Horas é um ponto de equilíbrio dentro da obra do cineasta. É quando os ambientes de Caminhos Perigosos e Taxi Driver encontram o tom de O Rei da Comédia. Scorsese confia em Griffin Dunne como seu guia, dando uma das mais generosas e subestimadas atuações em sua obra. Dunne se perde na noite de um EUA que pertencem a Scorsese – digno de um humor negro que só alguém com muito carinho por ele poderia criar" (Guilherme Martins).
P.S.: a liga agradece a todos os integrantes que atenderam à convocação e mandaram os textos sobre os filmes.